“Privatizar o Metrô irá piorar o serviço e aumentar a tarifa”, diz Camila Lisboa
Presidenta do Sindicato dos Metroviários de São Paulo avalia os impactos da privatização para a população e os interesses da iniciativa privada
Publicado: 18 Julho, 2023 - 16h07 | Última modificação: 18 Julho, 2023 - 18h22
Escrito por: Vanessa Ramos
Como marca de sua gestão há sete meses, o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos), defende a privatização de diferentes serviços públicos.
A concessão do transporte sobre trilhos está na mira do governador, que já encomendou estudos sobre a viabilidade da proposta, transferindo para a iniciativa privada ramais de Metrô e trem da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
O governador já sinalizou publicamente suas intenções em relação à operação das linhas 1-Azul, 2-Verde, 3-Vermelha, do Metrô, e 15-Prata, da CPTM, dando continuidade ao seu projeto para SP.
A reportagem da CUT-SP entrevistou a presidenta do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Camila Ribeiro Duarte Lisboa, para falar sobre o tema.
Camila trabalha há 11 anos no Metrô. Ingressou em 2012 como agente de estação, cargo que, entre outras funções, atende a população nas catracas, opera a sala de supervisão operacional, conduz pessoas com deficiência e auxilia os usuários de modo geral durante o deslocamento dos passageiros.
Camila coordena agora a próxima agenda de luta dos metroviários. Neste mês, a categoria decidiu em assembleia pela realização de uma greve no dia 15 de agosto contra demissões, terceirização e privatização. Os trabalhadores também cobram abertura de concurso público para diferentes áreas.
Confira a entrevista na íntegra.
CUT-SP: O governo Tarcísio de Freitas tem investido em estudos para ampliar a privatização. Como avalia a transferência de ramais de Metrô e de trem para a iniciativa privada?
Camila Lisboa: As privatizações das linhas de Metrô e de trem tendem a ter um impacto muito negativo para a população que utiliza o serviço. Já existem experiências de linhas privatizadas tanto em São Paulo como em outras cidades do país que provam isso. A privatização tensiona para o aumento das tarifas porque, sob a lógica privada, essas empresas querem garantir o lucro, não estão preocupadas com a oferta do serviço.
CUT-SP: Quais foram as consequências da concessão do transporte sobre trilhos para a iniciativa privada em outros estados do país?
A SuperVia do Rio de Janeiro, privatizada há 25 anos, tem a tarifa mais cara do Brasil, custando R$ 7,40. Outra experiência mais recente foi a privatização do Metrô de Belo Horizonte. O leilão aconteceu em dezembro do ano passado, o processo de entrega terminou no início desse ano e, em julho deste ano, já houve o aumento da tarifa para R$5,30. A privatização, como disse, tensiona para isso.
CUT-SP: Nesse sentido, de maneira geral, a privatização piora os serviços ofertados para a população?
Sim, porque os dirigentes das concessionárias e seus acionistas trabalham com a ideia de redução de custo. Um grande exemplo são as linhas 8 e 9 da ViaMobilidade. Toda a programação de manutenção, a quantidade de efetivo e treinamento do efetivo é tudo de péssima qualidade. Não é por causa das pessoas, mas porque a gestão de uma empresa privada visa reduzir custos. Isso se dá em São Paulo, assim como em outras concessões que aconteceram, como foi o caso de Belo Horizonte. A privatização significa a transferência de recurso público para as empresas privadas.
Em São Paulo, por exemplo, existem as câmaras de compensação tarifária [envolve o financiamento de sistemas de transporte público de passageiros], que criou uma tarifa relativa às linhas privadas e outra tarifa relativa às linhas estatais.
CUT-SP: Como se dá essa diferença?
As linhas estatais recebem do governo uma tarifa superior à tarifa que o passageiro paga. Por exemplo, na linha 4-Amarela, apesar de a pessoa pagar R$ 4,40, o governo completa essa tarifa acrescentando cerca de R$ 1,92. Então cada passageiro transportado na linha 4-Amarela tem um custo de R$6,32. No Metrô e na CPTM públicos, estatais, a tarifa média que as empresas recebem é de R$ 2,07.
Segundo essa câmara de compensação, há prioridades na distribuição da arrecadação tarifária. A primeira prioridade é da linha 4-Amarela, a segunda é da linha 5-Lilás, da ViaMobilidade, a terceira é das linhas 8 e 9, da ViaMobilidade, e depois entram as linhas estatais.
As consequências da privatização podem ser vistas aí. O Estado gasta mais, mas para encher os cofres de uma empresa privada, dos seus acionistas, dos seus executivos que ganham, inclusive, muito dinheiro com altos salários e Participação nos Lucros e Resultados [PRL]. Por isso, não é verdade que a privatização das linhas do Metrô e do trem significa mais economia para o Estado, ao contrário, significa mais gastos.
CUT-SP: Diante de toda situação, a categoria decidiu pela realização de uma greve no dia 15 de agosto. Pode falar sobre a pauta?
Marcamos uma greve contra o processo de terceirização do Pátio Oratório, onde se faz a manutenção dos trens da linha 15-Prata. Vemos como perigoso e arriscado para a população o fato de que a empresa que irá assumir a manutenção dos trens é a mesma que produziu esses trens malfeitos e inseguros. Além disso, existem uma luta contra a privatização e a demissão de três companheiros do monotrilho.
[As demissões citadas por Camila Lisboa na entrevista foram comunicadas pelo Metrô no dia 6 de julho. Os funcionários da companhia estiveram envolvidos na colisão de dois trens do monotrilho da Linha 15-Prata, em 8 de março deste ano. Segundo o Sindicato dos Metroviários de São Paulo, os operadores de trem e do CCO da Linha-15Prata foram demitidos de forma injusta. A entidade explica que houve uma falha do próprio sistema de segurança].