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Juventude negra de Sorocaba marcha contra o racismo

Com máscaras de proteção contra a Covid-19, jovens protestam contra genocídio nas ruas

Publicado: 06 Junho, 2020 - 17h02 | Última modificação: 06 Junho, 2020 - 18h48

Escrito por: Fernanda Ikedo e Vanessa Ramos

Daia Moura/CC
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Há anos o povo preto grita e não é ouvido. Isso tem que acabar. Esta foi a tônica que se ouviu nas ruas neste sábado, 6, quando jovens negros de Sorocaba (SP) realizaram um ato antirracista, no centro da cidade, para protestar contra o genocídio da população negra e a violência institucional que tem ceifado vidas, incluindo crianças e jovens.

“A resistência do povo preto nesse momento está sendo foco dos holofotes. A sociedade saiu do comodismo racista para lutar e falar que é “antirracista”. O povo preto grita há anos e nunca é ouvido, um preto é morto no Brasil a cada 23 minutos e nunca nada é feito”, afirmou a estudante de Pedagogia, 21 anos, Michelle Andrade, uma das idealizadoras do protesto.

Segundo Michelle, o ato é uma oportunidade de expor e dialogar com a sociedade sobre a violência comumente praticada no Brasil. “Isso é só o começo da união de todos os Movimentos Negros de Sorocaba. Não iremos cessar. Enquanto o sangue preto continuar escorrendo, iremos gritar e lutar até quando for necessário”, completou a militante.

Diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba, Everton Souza ressalta a forma como a juventude vem se mobilizando. “Existe um brilho no olhar dos jovens protestando. Novas consciências estão se construindo, as lutas e combates têm se intensificado. Sorocaba despertou nisso e agora vão ter que segurar a gente”, disse o sindicalista.          

Chega de violência

O governo de Jair Bolsonaro (sem partido) é, na avalição da secretária de Combate ao Racismo da CUT-SP, Rosana Aparecida Silva, a expressão máxima do que há de reacionarismo com explícitas posturas sexistas, xenofóbicas e racistas.

“A violência se expressa de diferentes formas. Além do assassinato de nosso povo, que tem suas vidas ceifadas, seus sonhos interrompidos e famílias destruídas, a população negra recebe os menores salários e é a menos representada na política e nos espaços de poder”, pontuou a dirigente.

Para a advogada e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Sorocaba, Emanuela Barros, o protesto é uma representação de resistência frente “a um governo fascista que ameaça a vida da população em detrimento do capital financeiro e da própria família Bolsonaro”, afirmou.

É contra essas formas de violência apontadas por Rosana e Emanuela que dezenas de jovens e militantes de movimentos negros, com álcool em gel nas mãos e máscaras de proteção contra a Covid-19, levantaram faixas com pedido de justiça, entoando o grito “Fora Bolsonaro”.

Um rosto sorocabano também apareceu nas faixas e banners levados pelos militantes do movimento negro. A do locutor Milton Dinho, integrante da União de Negros pela Igualdade (Unegro), morto em uma ação da Polícia Militar (PM) em Sorocaba, em dezembro de 2018.

Daia Moura/CCDaia Moura/CC

Num dos momentos mais emocionantes da marcha, que iniciou na praça Frei Baraúna, no centro, em direção à Praça do Campolim, na zona sul, os manifestantes sentaram na rua, ergueram os punhos e entoaram frases contra a opressão. Em referência às palavras do norte-americano George Floyd, cujo assassinato por um policial branco em 25 de maio desencadeou um movimento de protesto nos EUA como não se observava há anos, os jovens diziam: “eu não consigo respirar”, frase dita por Floyd enquanto era sufocado até a morte pelos joelhos do policial em seu pescoço.

“Estou aqui por todas as mães pretas que neste momento estão chorando a morte dos filhos, dos netos. É uma dor que ninguém apaga, estamos clamando por justiça em todos os lugares do mundo. É um dever cívico, de memória, dever para com nossos ancestrais para que, de alguma forma, a justiça seja feita. Precisamos de justiça para que essas pessoas racistas saibam que não saíram impune! Respirar é nosso direito”, disse a atriz e doutoranda em Educação, Daia Moura.

O ato antirracista neste sábado (6) também prestou homenagem à mãe de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que morreu ao cair do nono andar, na terça-feira, dia 2, enquanto a “patroa” da mãe fazia as unhas e obrigava Mirtes, a mãe do menino, levar os cachorros para passear.