Felisa 2024 completa 7 anos com literatura, música e incentivo à escrita e leitura
Feira Literária de Santo André amplia vozes de autores independentes, conecta leitores e escritores e apoia a comercialização de obras literárias
Publicado: 06 Dezembro, 2024 - 13h53 | Última modificação: 10 Dezembro, 2024 - 14h03
Escrito por: Rafael Silva e Vanessa Ramos - especial para Felisa

A Feira Literária de Santo André (FELISA) 2024 celebrou sua sétima edição como um espaço de resistência cultural, de inclusão e de valorização da literatura. Com entrada gratuita e organizada pelo Sindicato dos Bancários do ABC, o Sindicato dos Professores do ABC (Sinpro ABC) e a Editora Coopacesso, a feira reuniu entre os dias 22 e 24 de novembro escritores independentes, leitores e artistas em uma programação diversa, apoiada pela Lei Paulo Gustavo, que financia iniciativas culturais em todo o Brasil.
O organizador do evento, Claudio Noronha, destacou a relevância da leitura para a transformação social. “O acesso à leitura ainda é limitado por diversas razões. Tornar a leitura parte do cotidiano das pessoas é um processo que precisa ser construído e integrado a um projeto estratégico do Estado, do poder público. Mas, como sociedade civil, também temos a responsabilidade de contribuir para mudar essa realidade.”
A presidente do Sindicato dos Professores do ABC (Sinpro ABC), Edilene Arjoni reforçou a importância do evento aberto a todos os públicos. “Ao longo dos anos, muitos temas importantes foram tratados, tornando a FELISA um evento gratuito cultural marcante. Nesta edição, tivemos a oportunidade de abordar questões fundamentais como meio ambiente, cultura, arte e adoção", disse.
Essa perspectiva foi complementada pelo presidente do Sindicato dos Bancários do ABC, Gheorge Vitti, que celebrou a trajetória da feira. “São sete anos de feira, sete anos de história, sete anos de apoio à leitura e à literatura.” Vitti também ressaltou que a feira não se restringe à cidade de Santo André, mas abrange toda a região do Grande ABCDMRR (Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra), ampliando seu impacto cultural e literário.
Neste sentido, a secretária de Formação do Sindicato dos Bancários do ABC, Inez Galardinovic, refletiu sobre o papel das políticas públicas no fortalecimento da leitura e do desenvolvimento social. “A literatura, a leitura e a formação são pilares essenciais para o desenvolvimento da sociedade. Valorizar gestores que promovem políticas públicas voltadas à leitura é essencial para garantir o progresso social e cultural.”
Homenagem a Manuel Filho
Entre os momentos mais marcantes da FELISA 2024, o escritor, cantor e ator Manuel Filho, natural de São Bernardo do Campo, foi homenageado com uma placa de reconhecimento por sua contribuição à literatura e à cultura brasileira.
Vencedor do Prêmio Jabuti e autor de diversas obras, Manuel ressaltou a importância das bibliotecas públicas na formação de leitores, porta de entrada que o inspirou em sua trajetória.
“As bibliotecas públicas precisam ser valorizadas e manter acervos sempre renovados, com livros novos e também com títulos antigos que nunca foram lidos, porque para muitos leitores eles ainda são descobertas. A literatura é essencial para a imaginação e a compreensão do mundo. Imagine como seria viver sem as histórias que conhecemos — os romances, os contos, as narrativas que ouvimos em casa ou nas escolas. Elas moldam quem somos. Quanto mais histórias conhecemos, maior é a nossa capacidade de imaginar e de entender o mundo.”
Para o escritor e presidente da editora Coopacesso, Jerônimo de Almeida Neto, a leitura é instrumento de mudança social. “É um instrumento importante para a transformação das pessoas. Quem lê, transforma o mundo.”
A conexão entre literatura e desenvolvimento humano também foi destacada por Maria Lúcia Minoto da Silva, mais conhecida como Malu, vice-presidente do Sinpro ABC, que igualmente ressaltou a importância do hábito da leitura desde cedo.
“A literatura desenvolve o pensamento, nos faz viajar e aprender sobre tudo. Uma criança que lê amplia seu vocabulário, melhora a interpretação textual e se torna um adulto com sede de leitura. Quem lê enxerga melhor o mundo, entende a sociedade e contribui para uma sociedade mais humanizada.”
Secretário de Comunicação do Sindicato dos Bancários do ABC e da CUT-SP, Belmiro Moreira acrescentou que a leitura é fundamental para o fortalecimento da cidadania. “A leitura é fundamental para formarmos opinião e transformarmos o mundo. É por meio dela que conhecemos nossa história, ampliamos nosso respeito à diversidade e combatemos retrocessos. Fortalecer o acesso à leitura é essencial para construir uma sociedade mais justa e inclusiva.”
Literatura e escritores independentes
A FELISA 2024 também foi palco para reflexões sobre o impacto da literatura na sociedade. Inúmeros autores comercializaram suas obras durante a feira todo o final de semana do evento, bem como ocorreram diversos lançamentos de livros, como “Diadema Ltda – Livro 1”, de Wagner Santana, “A Vida e o Vento”, de Kalil Chaaban, “A Borboleta Sofia”, de Guaraciaba Cardozo de Araújo, “Um Olhar e Tudo Se Transforma”, de Renilton S. da Luz, “Meio-Dia”, de Willian Martins, “Lutar É Preciso – A Saga de Aldo Josias dos Santos”, de Ana Valim, e “O Incrível Mundo de Bartolomeu”, de Mileide Francisco.
O poeta Manoel Hélio Alves, de Macarani (BA) e autor do livro "Uma Poesia Para Raul", destacou a importância dos espaços literários para escritores independentes. “Tanto o escritor independente como o editor independente têm que procurar as feiras literárias, os salões, os espaços e até mesmo criar esses espaços para poder mostrar ao mundo e à sua região os seus escritores, os seus talentos e a sua literatura.”
Para o professor e autor Eric Brito, conhecido por obras como "O Último Dia da Minha Vida" (2022), "Achados ou Perdidos" (2023) e a "Banda Nova: uma aventura de acordes mal tocados" (2024), "a literatura é tão importante quanto a saúde, a educação e o acesso aos itens mais básicos da sociedade. É a partir da literatura que construímos pessoas com um senso de reflexão aguçado, com um senso de compreensão do mundo que está em torno dela”, avaliou.
O poeta de cordel Pedro Monteiro trouxe uma visão poética sobre a importância da leitura como fonte de prazer e conhecimento. “A literatura nos engrandece e faz com que sejamos mais humanos, mais perceptivos aos acontecimentos da vida. Incentivo a leitura como fonte de prazer, mas também como uma ferramenta para o aprendizado contínuo. Quem acha que sabe tudo não passa de abelhudo, precisa se refazer.”
Arte e literatura antirracistas
A escritora, atriz e educadora, Mercia Magalhães, esteve na feira e destacou a representatividade e a educação antirracista presentes em suas obras.
“A FELISA traz para a gente esse espaço maravilhoso, esse lugar onde queremos estar, colocando a literatura como uma ferramenta de resistência na arte e na cultura. Para que a gente possa trazer para a sociedade todas essas reflexões que são tão necessárias para as mudanças que precisamos.”
Os participantes da FELISA 2024 também tiveram a oportunidade de visitar uma sala infantojuvenil especialmente montada para abordar questões como respeito às diferenças, combate ao racismo e valorização da diversidade.
Uma turma de jovens do Centro Cultural Afro Brasileiro Francisco Solano Trindade participou das atividades, em um dia cheio de aprendizado e diversão. Os jovens acompanharam contação de histórias, participaram da produção de abayomis e, ao final, cada um recebeu um voucher para adquirir um livro. Após o evento, compartilharam fotos nas redes sociais agradecendo à secretária de Esporte e Cultura do Sindicato dos Bancários do ABC, Carina Leone, que percorreu os espaços ao lado do grupo, interagindo, participando ativamente e apresentando cada parte da feira.
Durante as atividades, a autora e contadora de histórias, Conceição Rosa, explicou a proposta do espaço e os materiais apresentados.
“Preparamos uma sala para trabalhar a questão antirracista, trazendo bonecos que representam a cultura africana e afro-brasileira, além de instrumentos indígenas e esculturas feitas de jornal reaproveitado. Tudo aqui reflete o respeito à natureza, ao meio ambiente e às diversidades culturais.”
A iniciativa, de acordo com Conceição, utilizou objetos que remetem às Leis de n°10.639, de 2003, e de n°11.645, de 2008, que estabelecem a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena nas escolas.
Realizada em novembro, Mês da Consciência Negra, a FELISA reafirmou, segundo as escritoras, a importância da luta antirracista e do respeito às diversidades culturais.
Premiação FELISA Poética
Um momento importante do evento foi o anúncio do Concurso FELISA Poética 2024, uma iniciativa que busca incentivar e fomentar o movimento poético regional e independente. A premiação incluiu a publicação de um livro, pela Editora Coopacesso, para o primeiro colocado, além de uma coletânea reunindo os demais poemas selecionados.
Neste ano, a primeira colocação foi conquistada por Décio Araújo Filho, com o poema "Adega, vinhos e poesia". Décio se destacou como o primeiro homem a receber a premiação em todos os anos da feira. A segunda colocação ficou com Bebel Ritzmann, autora de "Brechó", seguida por Coracy Bessa, com o poema "Alvorecer".
Com 36 inscritos de diferentes regiões do país, o concurso contou com a avaliação de um júri popular, que analisou os textos com base em critérios como estética, criatividade, linguagem poética, originalidade e desenvolvimento.
Décio Araújo Filho, residente de Santa Luzia, Minas Gerais, destacou a importância do reconhecimento. “Parabenizo os organizadores desta iniciativa e espero que ela seja multiplicada por todo o Brasil, porque há muitas pessoas talentosas que não têm visibilidade. Esses festivais e concursos, por si só, já são um verdadeiro prêmio. Receber essa honra é motivo de grande orgulho.”

Música e interação
A programação da FELISA 2024 foi repleta de atividades culturais que uniram música, literatura e reflexão. Apresentações musicais emocionaram o público ao longo dos três dias, com Lorenzo Galardinovic abrindo e encerrando a sexta-feira com sua voz e violão.
Leandro Matos e Edu Guerra encantaram com suas performances intimistas no sábado e, no domingo, Miryan Lopez trouxe sensibilidade e energia em sua interpretação musical. O Sarau “Poemas da Cidade” e o Sarau do “ManoÉlio” também foram destaque, reunindo músicos e poetas em um momento vibrante de celebração artística.
Outro ponto alto foi a intervenção e o cortejo do Coletivo Teodoras do Cordel, com o tema "Mulheres no Cordel". O grupo trouxe brasilidades à feira e destacou a importância da ocupação feminina na literatura, resgatando as vozes de mulheres que, por muito tempo, foram apagadas da história. Com poesia e resistência, as Teodoras reforçaram o papel transformador da arte no cenário cultural.
Ao longo do evento, os participantes também puderam acompanhar rodas de conversas sobre diferentes temas. Uma delas contou com a participação do ex-dirigente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro, Marcello Azevedo, que abordou o desenvolvimento histórico do sistema financeiro da China, maior parceiro comercial do Brasil desde 2009.
Azevedo é doutor em Relações Internacionais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e autor do livro "As Finanças do Dragão", da editora Dialética.

Em outro momento, a escritora e psicóloga Maria Angélica Amarante dos Anjos, de forma sensível, apresentou seu relato sobre as experiências e transformações proporcionadas pela maternidade pelas vias de adoção.
Autora de livros sobre o tema, Maria Angélica se tornou militante da causa e tem contribuído e inspirado diversas famílias a entenderem o universo da adoção, livre de preconceitos e pré-julgamentos.
Outra roda de conversa foi sobre as contribuições dos trabalhadores em cultura nas atividades de educação ambiental, que teve como convidado o secretário de Cultura da CUT-SP, Carlos Fábio, conhecido como Índio.
Com sete anos de história, a FELISA reafirma-se como um espaço que amplia vozes, conecta leitores e escritores e promove a comercialização de obras literárias, demonstrando o poder transformador da literatura na construção de uma sociedade mais justa e humana.
Durante todo o evento da FELISA, pela primeira vez, foi oferecido um serviço de intérpretes de Libras (Língua Brasileira de Sinais), promovendo a inclusão de pessoas surdas ou com deficiência auditiva.
O local do evento foi planejado para assegurar plena acessibilidade, contemplando diferentes necessidades. Havia estrutura adaptada para pessoas com mobilidade reduzida ou que utilizam cadeira de rodas, além de suporte especializado oferecido por uma equipe de monitores identificados por coletes verde-claro. Os monitores estavam disponíveis para atender pessoas com deficiência visual, auxiliar na locomoção, oferecer orientações gerais e garantir que todos os participantes pudessem usufruir das atividades com autonomia e inclusão.
