Empregabilidade e papel dos sindicatos contra o racismo são destaques em seminário
Evento promovido pela Secretaria de Combate ao Racismo da CUT-SP reuniu sindicatos e movimentos na última quarta-feira, 27
Publicado: 28 Novembro, 2024 - 15h22 | Última modificação: 28 Novembro, 2024 - 16h39
Escrito por: Laiza Lopes e Rafael Silva - CUT São Paulo
A inserção da população negra no mercado de trabalho foi o destaque do seminário realizado pela Secretaria de Combate ao Racismo da CUT São Paulo, nesta quarta-feira, 27. Cerca de 22 sindicatos e movimentos se reuniram no auditório da CUT para dialogar sobre o tema e refletir sobre o papel do sindicato no combate à desigualdade racial nos locais de trabalho e na sociedade.
“O movimento negro faz diversas lutas: saúde, educação, trabalho. O bem-viver da população negra se manifesta de várias formas. Vários sindicatos fizeram atividade em novembro, mas temos discussões em diversos períodos do ano e também vemos o avanço dos sindicatos na criação de coletivos. Fazer esse seminário é luta e resistência. A CUT é o nosso quilombo”, ressalta Rosana Silva, secretária de Combate ao Racismo da CUT-SP.
Com um panorama local, o presidente da CUT-SP, Raimundo Suzart, refletiu sobre os desmontes das políticas públicas em São Paulo, que têm consequências negativas para a classe trabalhadora, especialmente para o povo preto.
“Tivemos a notícia de que o governo estadual irá fechar turmas de ensino noturno em São Paulo. Essa medida impactará profundamente a população negra. Como os jovens, mães solos, negros que trabalham irão estudar? Sabemos que a realidade da população preta e periférica é trabalhar para ajudar em casa”, pontua o presidente. Ao menos 96 turmas de Ensino Médio e EJA (Educação de Jovens e Adultos) que funcionam no período noturno das escolas estaduais de São Paulo devem ser fechadas, no próximo ano, pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos).
A vice-presidenta da CUT-SP, Ivone Silva, participou da abertura do encontro e compartilhou sobre a importância de ampliar a representatividade das mulheres negras em espaços de poder.
“Nós, as mulheres negras, estamos lá embaixo na pirâmide, seja em questão de salários, cargos de gerência. Poucas mulheres se elegeram como vereadoras e mulheres negras menos ainda. E quando são eleitas sofrem violência porque são atacadas. Quem está no poder não se conforma em ver as mulheres negras em posições assim”, afirma Ivone.
Mercado de trabalho e educação
Na primeira mesa de diálogo, a co-fundadora e vice-presidente do Instituto Pactuá e membra da diretoria ABRH, Iris Pereira Barbosa, contou sobre sua trajetória profissional e o processo de diversidade nas empresas. No instituto, ela atua com mentorias para lideranças negras.
“Todos temos responsabilidade na mudança para maior igualdade racial nas empresas. O papel das organizações é dar a oportunidade e desenvolver as pessoas; o governo traz o apoio com as legislações e regulamentações. E para a população negra esse papel passa pelo fortalecimento da rede de apoio, com ferramentas para capacitação e aprendizagem”, comenta Iris.
Claudio Marques da Silva, professor e coordenador do centro de pesquisa racial da Universidade Zumbi dos Palmares, trouxe a perspectiva política na desigualdade racial.
“Nós passamos por uma dificuldade nos anos 90 com a dívida externa e a falta de políticas públicas. Isso trouxe uma proposta neoliberal, com a redução do estado, aumento da privatização, falta de investimento público, o que perpetua as desigualdades raciais. Nesse sentido, há uma população cada vez menos consciente do que se deve lutar, em um ciclo vicioso, com mais elitismo, mais concentração política e de renda”, avalia o professor.
No período da tarde, Anna Paula dos Santos, técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apresentou dados sobre a inserção da população negra no mercado de trabalho.
De acordo com dados do Dieese, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), do IBGE, referentes ao 2º trimestre de 2024, das 10 ocupações com maiores rendimentos, os negros ainda são minoria, representando somente 27%.
Com relação aos salários, a situação também é alarmante. O rendimento médio dos negros é 40% inferior ao dos não negros. As mulheres negras, como sempre, são as mais prejudicadas neste cenário: o rendimento médio delas no país era de R$ 2.392, valor 40% abaixo ao dos demais trabalhadores (R$ 4.008).
Em seguida, o advogado e professor Douglas Martins de Souza falou sobre a construção da Secretaria de Políticas e Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), durante o primeiro mandato do presidente Lula (2003-2011) e as políticas para promover a igualdade racial no mundo do trabalho.
Douglas trouxe todo o contexto de criação da SEPPIR, na época muito celebrada pelo movimento negro e social do país. Mas destacou que, para conseguir ter uma atuação, a secretaria precisou enfrentar muitas resistências políticas, inclusive, de dentro do próprio governo - vindas de setores constituídos antes mesmo da Nova República e que, portanto, estavam sob uma cultura ainda racista, com muitos não negros dominando a maioria dos cargos de comando. “Como tínhamos a transversalidade nas políticas, era preciso dizer a todo momento que aquela determinada pasta (ministério) tinha que se envolver na ação e garantir em seu orçamento recursos para a promoção da igualdade”, disse.
Para o advogado, negros e negras precisam disputar todos os espaços, pois é dessa forma se chegará a um equilibrio de justiça. “O Brasil não vai realizar nenhuma justiça social sem a nossa presença no devido lugar (ocupando os espaços a serem transformados)”, destacou.
Com atuação no movimento sindical, Douglas também reforçou a importância de se garantir nas convenções coletivas cláusulas sociais de promoção da igualdade, uma ação que conseguirá reverter, na ponta, a sub-representação ou ausência racial no mercado de trabalho. “A disputa pela direção política da sociedade é uma tarefa da classe trabalhadora”, finalizou.